Portaria do Governo afasta arrasto de fundo de vastas áreas da plataforma continental portuguesa.
É raro, mas desta vez os ambientalistas estão satisfeitos
com o Governo português. Uma portaria publicada há pouco mais de uma semana,
regulamentando a pesca na maior parte das águas portuguesas, proíbe o arrasto
de fundo, uma técnica temida pelos seus efeitos sobre o leito do oceano.
Publicada dia 28 de Maio, a portaria fixa que só a pesca
com anzol e linha será autorizada numa vasta área, com mais de dois milhões de
quilómetros quadrados, sobretudo nas zonas abrangidas pela extensão da
plataforma continental do país além das 200 milhas da zona económica exclusiva
(ZEE).
Mesmo deixando de fora grandes
áreas da ZEE mais próximas do Continente, Açores e Madeira, a medida foi bem recebida
por organizações de defesa dos oceanos por
proibir, na prática, o arrasto de profundidade. Esta arte de pesca envolve
submergir uma enorme rede, atada a pesos, que pousa sobre o fundo e depois é
arrastada, capturando peixes e outros organismos que vivem junto ao leito. O
problema é que, no trajecto, o arrasto literalmente varre tudo o que está pela
frente, deixando atrás de si um autêntico deserto.
Muitos países introduziram já
legislação a proibir ou limitar o arrasto de fundo. Na União Europeia, uma
proposta da Comissão para banir esta arte de pesca abaixo dos 600 metros de
profundidade foi rejeitada pelo Parlamento em Dezembro passado,
por uma escassa maioria.
É em grande parte por isso que
algumas organizações ambientalistas saudaram a iniciativa de Portugal “Acreditamos que esta medida vai ter ecos fora
do país”, afirma Gonçalo Carvalho, da Associação de Ciências Marinhas e
Cooperação, uma das 70 organizações, de vários países, que integram a Coligação
para a Conservação dos Fundos Oceânicos. “É um sinal de que Portugal quer gerir
bem essa área e explorar de forma sustentável os recursos que aí existem”,
completa Carvalho.
Na quarta-feira, a Oceana, uma
organização internacional dedicada à protecção dos mares, já tinha saudado a
decisão de Portugal. “Esperamos que esta medida, que afecta uma área quatro
vezes maior do que a Península Ibérica, inspire outros países com interesses de
pesca na área a adoptaram proibições semelhantes”, disse Xavier Pastor,
coordenador executivo da Oceana para a Europa, num comunicado.
A portaria aplica-se apenas às embarcações portuguesas.
“Isto para já é um exemplo e estamos a convidar os outros a aderirem à nossa
iniciativa”, afirma o secretário de Estado do Mar, Manuel Pinto de Abreu.
O governante diz que as normas
agora aprovadas seguem-se a outras para garantir uma exploração sustentável dos
fundos marinhos na plataforma continental. “Temos vindo a tomar uma série de
medidas de precaução”, refere, dando como exemplo a constituição de cinco áreas marinhas protegidas na zona abrangida
pela extensão da plataforma.
“Não estamos a impedir a
exploração, queremos é que seja sustentável”, afirma Pinto de Abreu. “Não há um
preconceito contra artes de pesca. Há
formas de arrasto que não representam problemas”, completa.
A portaria pode, na prática, ter
um efeito limitado sobre a frota nacional. Áreas importantes onde a pesca é
exercida não estão abrangidas pela legislação. E nos mares mais próximos dos
Açores e da Madeira, o arrasto de
fundo já está proibido desde 2005.
Além disso, uma boa parte da pesca de profundidade no país
é feita com a arte do palangre – longas linhas, com centenas de anzóis, com as
quais se captura por exemplo o peixe-espada preto. “Portugal, na pesca de
profundidade, é um exemplo. São pescarias sustentáveis”, afirma Gonçalo
Carvalho.
Mas tanto ambientalistas, como o Governo, estão
contentes. “Tudo isto cria uma vaga de fundo que pode ganhar força”, justifica
o secretário de Estado do Mar.
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